Já
revelei aqui neste espaço que uma das músicas mais bonita da MPB é aquela
composta por Nelson Motta e cantada pelo Lulu Santos, que diz que na vida tudo
passa, tudo sempre passará, como uma onda no mar. No entanto, para o grande
compositor gaúcho e boêmio Lupicínio Rodrigues, isso não é verdade, é uma
deslavada mentira.
Valendo-se
de sua “dor de cotovelo” que tanto lhe torturava e que não se libertava (de
vítima) dos amores e desamores, de paixões e desilusões avassaladoras, fez
transportar para as canções essa melancolia como bem é retratada em “Nervos de
aço”: “Você sabe o que ter um amor, meu senhor/Ter loucura por uma mulher/E
depois encontrar esse amor, meu senhor/Nos braços de um tipo qualquer”. Como se
vê, um caldeirão pulsante de amargura.
O
cenário é o mesmo: o cara entra no bar sozinho e magoado, ferido, pisado,
contundido amorosamente. Na cabeça, a amada, “aquela ingrata”, que o abandonou
por outro (Ricardão!). Como não poderia deixar de ser, pede um chope, um uísque
ou uma aguardente, ficando por ali durante horas, remoendo a tristeza pela
separação. Sem tergiversação, um autêntico folhetim de libelo “cornista”.
Ninguém
soube expressar como Lupi (carinhosamente como era chamado) a mais acachapante
e abjeta “cornitude”. Diferentemente do Noel Rosas, Oreste Barbosa e Chico
Buarque que escreveram brilhantes canções sobre o “descorno”. Ele era de enfiar
o pé na lama e se expor sem restrições suas bizarras mágoas.
O
barato de suas canções é o texto musical. Verdadeiro oceano de trivialidades
amorosas, puxada pela filosofia “botequinesco” e da dramaturgia diária da
boemia. Um complexo emocional em que se mistura “dor de corno”, saudade, algum
desejo de vingança, muito amor mal cicatrizado.
Por
isso, que se tornou um dos ícones da fossa e da desilusão. Cujo tema de suas
canções, invariavelmente baseado em fatos reais, era centrado na danada da
traição. Veja a sua manifestação de revolta nos versos de “Nunca”: “Nunca/Nem
que o mundo caia sobre mim/Nem se Deus mandar/Nem mesmo assim/As pazes contigo
eu farei”.
Tinha
orgulho de ser boêmio. Costumava dizer “É melhor brigar junto do que chorar
separado”. Nas suas desventuras com as mulheres que desfilaram pela sua vida,
levou-o a compor e a gravar umas 150 canções (marchinhas de carnaval e
sambas-canção), músicas que expressavam sentimentos de um amor perdido.
Outro
catedrático da boemia, Vinicius de Morais, confessava que “Todo poeta só é
grande se sofrer”. Assim, em 1974, Lupicínio Rodrigues, aos 59 anos, conhecido
pelo estilo bordão “dor de cotovelo”, morreu como viveu: do coração.
LINCOLN CARTAXO DE LIRA
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