segunda-feira, 24 de junho de 2013

A revolta popular



       Não. Chega. Basta. A fantasia de que o Brasil está um paraíso, uma maravilha, acabou. Os protestos pelo o País afora demonstram que a população esgotou, chegou ao seu limite e reivindica decência com a coisa pública.
            Há, em toda a sociedade, um estado de beligerância que explode de várias maneiras. E aí passa pela minha cabeça (é vero) a pertinente omissão: sobre quanto poderia ter feito e não fiz; sobre as passeatas em que não estive presente; sobre os artigos indignados ou indicativos de solução que não escrevi; sobre meus votos mal concedidos.  E logo vem, sem nenhum disfarce e em forma pleonástica: “mea-culpa, mea máxima culpa”.
            A mobilização, verdadeira alma da democracia, é o melhor antídoto contra a humilhação que é a nossa saúde pública vilipendiada, o ensino público depauperado, a vida absurda das cidades, os entulhos de automóveis pelos incentivos do governo federal, a violência que não para de crescer e nos transportes públicos relativamente mais caros (e precários) do mundo. Sem falar, evidentemente, da corrupção que envolve a classe política. É uma espécie de cachaça da profissão de parlamentar.
            Meu amigo Cordeiro, obcecado pelas palavras, sobre essas manifestações, alfinetou: “Foi um pé no saco dos políticos”. E foi mesmo. Só que eles estão pouco se lixando, já que os seus currais eleitorais só acreditam no que eles dizem e sempre votaram neles. Por isso, investir em educação no futuro vai atrapalhá-los, pois um povo educado sabe quando está sendo manipulado e não gosta de atitudes populistas. Prática escabrosa que nos leva a sentir vergonha de ser honesto, de ter estudado duro e trabalhado sempre, criado e preparado filhos para serem cidadãos íntegros e corretos.
            Tenho falado, aqui neste espaço, que o Brasil está de joelhos diante de tais mazelas. E a presidente Dilma, segundo um articulista, chacoalhou demais o barco brasileiro, provocando náuseas generalizadas tanto em sua tripulação como entre seus passageiros/eleitores.
            Redundante asseverar que a imprensa, de modo geral, tem que ser mais combativa nas trincheiras (ideias) das revoltas populares, intransigente na defesa da democracia, como bem definiu Millôr Fernandes: “Imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados”.
            Democracia é barulho. Quem gosta de silêncio prefere ditaduras. Porém, o bom-senso não pode tolerar que arruaceiros e vândalos dominem as manifestações, sob pena deles perderem a grandeza, os altos sentimentos e os objetivos pelos quais nasceram.
            Com essa insatisfação popular, vamos mostrar que a democracia deixa de ser uma mera expressão retórica. Que nos sirva de lições!

                                                                          LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                          lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                            Advogado e Mestre em Administração

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Disney Institute



       Sou da época em que não existiam institutos ou livros de aprimoramento pessoal e profissional. Não existia, por exemplo, o Disney Institute, um departamento de consultoria e educação continuada criado para ensinar empresários e grandes companhias a serem mais... Disney!
            É uma espécie de MBA, com uma curiosa combinação de programas de treinamento, bench-marketing e aperfeiçoamento. Experiência nesse ambiente corporativo, então, nem se fala. Todo santo dia, algo em torno de 175 mil pessoas passeiam pelos parques da Disney nos EUA. O reflexo mais óbvio desse público é o faturamento, claro, que bate a casa dos R$ 13 bilhões anualmente.
            Fiquei maravilhado com o nível de organização, quando lá estive. Observei que os visitantes (turistas) estavam com esse mesmo sentimento de encantamento e pronto para surfar na onda da modernização da linguagem visual.
            De olho nessa maré, grandes empresas costumam procurar o Disney Institute para lidar com problemas específicos. A Chevrolet, por sua vez, queria ajuda para melhorar o atendimento nas concessionárias, enquanto o time Brooklin Nets procurava a melhor maneira de vender “hot dog”. Companhias médias também recorrem ao instituto para aprender um pouco da eficiência milimétrica de seus parques.
            O curioso é que, seja lá qual for o formato das aulas, o ensinamento é basicamente o mesmo dito por Walt Disney em uma palestra, há 50 anos: “Faça algo tão bem que as pessoas vão querer voltar para ver seu trabalho novamente e vão trazer outras pessoas para mostrar o quão bom você é naquilo”.
            Outra coisa: independente do porte da organização, seja uma loja de botões ou uma companhia telefônica, Disney Institute nos ensina que se deva aprender e adaptar as boas ideias de seus concorrentes. E mais: ter uma empresa no setor de serviços é como atuar em uma peça. No palco, você é um personagem, alguém que está ali para proporcionar uma experiência diferente e agradável. Na Disney, funcionários não são chamados assim, de “funcionários”, mas de “cast members”, membros do elenco.
            Diferente do tipo de atendimento cosmético ou atabalhoado visto por aí, lá, na Disney, se você comprar um balão e ele estourar, os funcionários lhe darão outro. O mesmo ocorre se  um sorvete cair no chão – não importa o status do funcionário, há no manual um mandamento: ele precisa abandonar o que estiver fazendo, pegar um novo sorvete e entregar para a criança desastrada.
            Essa atenção aos detalhes deveria ser parte da cultura de todas as empresas, já que são os pequenos toques que cativam os clientes.


                                                                      LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                       lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                         Advogado e Mestre em Administração

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Mata-burro do desenvolvimento



            Se puder dar uma entrada na cidade de Goiana, quando estiver dirigindo a Recife, vai verificar que esse lugar mudou a sua rotina. Tudo devido a futura fábrica da FIAT, previsto para 2015. Quando esse empreendimento estiver concluído, gerará emprego para 4.500 trabalhadores. Investimentos em torno de R$ 5,1 bilhões na referida unidade, onde serão produzidos até 250 mil veículos por ano, numa área de 1.400 hectares.
            Os modelos que serão produzidos serão mantidos em segredo pela montadora. Além da FIAT, outras 14 fábricas fornecedoras devem formar um pólo automotivo em Goiana, composto ainda por centro de treinamento, centro de pesquisa, pista de testes e campos de prova. Já o SENAI, por sua vez, pretende investir cerca de R$ 30 milhões na construção de uma escola técnica voltada exclusivamente para o pólo. Sem falar da importância do pólo vidreiro e do pólo farmacoquímico, juntos num investimento de R$ 1,5 bilhões.
            Nossa! Como dá uma inveja danada o sucesso dos nossos vizinhos pernambucanos. São canteiros de obra em tudo que é lugar. E aí quase morro infartado quando li que o governo da Paraíba ficou feliz com o projeto da instalação da tal fábrica no município de Goiana. Lamentavelmente, é um tipo de interpretação subversivamente conservadora da cultura-política de gestão.
            Parece uma piada, mas é surrealismo, sem nenhum predicado de nossa triste realidade. É um cenário desalentador para todos os paraibanos. Enquanto os nossos vizinhos caminham com a rapidez de uma lebre, vemos aqui a Paraíba com a morosidade de um cágado para se tornar um estado moderno e republicano. A verdade é que, entra governo e sai governo, isso se torna rotina. Paira a sensação de que falta rumo, falta direção, falta planejamento estratégico. Situação que nos puxa, ainda mais, à condição de vira-lata do imobilismo econômico.
            E, nessa vertente, subo pelas paredes quando ouço ou leio entrevista de nossos governantes dizendo que a Paraíba está no rumo certo para o desenvolvimento, ou melhor, está dando um salto de prosperidade. Tudo balela! Puro canto do vigário. Um fator importante responsável pela escassez de infraestrutura na Paraíba é a nossa histórica vontade política (apequenada pelo duelo de grupos políticos) e a falta de grandes projetos estruturantes.
            Tem sentido: a Paraíba empacou no mata-burro do desenvolvimento. Mata-burro, explico, é aquela ponte de travas espaçadas feita para impedir que o gado, o cavalo e quiçá burros fujam. A gente não consegue fugir.
            Serei franco: não dá! Esse descrédito afronta o cidadão paraibano. Tem que ter um cara de pé no chão, e plural, que fuja desse estereótipo ridículo que vem tomando conta de nosso futuro.


                                                    LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                    lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                      Advogado e Mestre em Administração

domingo, 2 de junho de 2013

Brega ou romântico



       Lembro-me como se fosse hoje, na década de 70, semanalmente à noite, o jornalista Flávio Cavalcanti apresentando pela Rede Tupi de Televisão o programa “Um instante, maestro!”, onde ficou popular quebrando discos de cantores após fazer críticas severas.
            Reli recentemente uma história, a propósito, que muitos cantores temiam se apresentar nesse programa porque Flávio Cavalcanti criticava impiedosamente certos discos (músicas), quebrando no ar os famosos “bolachões” (discos LP) e compactos. Numa dessas vezes, um dos convidados era o cantor Waldick Soriano, que fazia sucesso com “Eu não sou cachorro, não”. Por não gostar de músicas consideradas “bregas” e era certo que o seu disco seria também quebrado. Só que antes de começar o programa ele avisou: “Se você quebrar meu disco, eu lhe acabo no pau”. O resultado que Waldick cantou e o disco não foi destruído. Pense na batida de pino!
            É fato - um tipo de folhetim a lá Nelson Rodrigues - que os amores de Waldick Soriano viraram drama de gerações de brasileiros. Sua figura de chapéu preto e óculos escuros foi adorada. Passional, carismático e amargurado, deu o ponto de partida para uma linhagem de cantores nacionais, enquadrada como artistas “brega”. Confessa que fez show em todo canto do País: “Já cantei em casa de bacana e em puteiro de beira de estrada”.
            Por talento do destino, como ele explicava, as suas músicas embalam romances e desamores desde os anos 1960. Verdadeiro percussor do movimento conhecido como “brega”, no qual seguiu Odair José, Almir Rogério, Reginaldo Rossi, Sidney Magal, entre outros. Era um baiano boêmio, mulherengo e bem-humorado que fez a trilha sonora do próprio sofrimento: “Toda música minha tem alguma coisa de mim. Eu só faço música com motivo”.
            Ao longo da vida, brilhou com mais de 700 músicas, como “Torturas de Amor”, “Dama de Vermelho”, “A Carta”, “Eu também sou gente”, além de “Eu não sou cachorro, não”, sua marca registrada. O hit virou jargão em qualquer estado e foi cantada em inglês, por Falcão.
            Ignorá-lo, por desconhecimento ou por preconceito, é uma bobagem despropositada. O músico Zeca Baleiro (craque da MPB) observou: “Por trás do personagem cafona, com cara de durão, óculos escuros e chapéu de Durango Kid, havia um compositor fabuloso cujo repertório de canções passionais não ficava a dever a nenhum dos consagrados autores de bolero com reconhecimento internacional”.
            Longe da pecha preconceituosa, concluo que Waldick Soriano pertence a uma elite da música brasileira: a dos que criaram uma obra que está na memória coletiva nacional. É o retrato símbolo daquele que sobrevive excluído dos grandes planos da política brasileira.


                                                       LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                       lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                          Advogado e Mestre em Administração