domingo, 10 de setembro de 2023

O desfile de 7 de setembro

 

                    

       Outro dia eu vi uma postagem sobre o desfile de “7 de Setembro”, uma data cívica e comemorativa que relembra a declaração de independência do Brasil, realizada neste mesmo dia em 1822.

            Na minha época de colegial, não só em Cajazeiras como aqui (em João Pessoa), dificilmente o estudante escapava de participar dos desfiles de “7 de Setembro”, era uma imposição, sim.

            Eu me recordo de ter sido obrigado a sair do desfile, simplesmente porque as minhas meias (de cor preta) por estarem um pouco desbotadas. Isso por ordem do senhor Padre Vicente (conhecido assim, sem sobrenome), então diretor geral do Colégio Monsenhor Constantino de Vieira, no final da década de 1960, lá na minha terra natal, Cajazeiras.

            O citado reverendo fazia tremer todos à sua volta. Era sisudo, totalmente careca, abria a boca sem mostrar os dentes. Com sua batina preta surrada, quase arrastando pelo chão. Era absolutamente brabo e intransigente no quesito de disciplina. Ora, longe de mim querer lhe desobedecer.

            Ainda tenho fresco na memória que ele levava muito a sério o tal desfile, como se fosse um desfile militar: cabelos cortados e penteados, farda sempre bem lavada e engomada, sapatos reluzentes e por aí vai.

            De fato, já não se vê o desfile de “7 de Setembro” como antigamente. Na minha época de estudante, a gente sentia orgulho de participar desse desfile. As crianças, de um modo geral, saíam às ruas com pequenas bandeiras brasileiras de papel para assistir ao nosso desfile, como também dos militares, saldados marchando como se estivessem indo para uma guerra.

            O coração ainda era pequeno para compreender tudo aquilo, mas que, no nosso inconsciente, nos preenchia de orgulho por existir e morar no Brasil.

            Atualmente, não há mais neste país esse cenário que parece estar definitivamente apagado. Porém ainda vive na memória de muitos, a exemplo daqueles que participaram de minha geração.

            Sem meias palavras, o que se presencia nos dias de hoje é um desfile de ódios, de pronunciamentos inconsequentes, de disputas e de um cinismo que cobre tudo. Sempre com descaso e deboche. Sempre com discursos irresponsáveis e ameaçadores. Um acinte, um tapa na cara da sociedade. Mais do que se indignar, é preciso mudar conceitos.

            Perdoe-me, gente. No presente, a coisa anda esculhambada e esdrúxula, parece mais um desfile de Escola de Samba. O que é pior: de mau gosto!

 

 

                                              LINCOLN CARTAXO DE LIRA

           

Homenagem ao Patrono do Brega

 

          

        Recentemente, Recife ganhou uma estátua em homenagem a Reginaldo Rossi, cantor e compositor que morreu aos 69 anos, vítima de um câncer de pulmão.

            A citada obra está localizada no Pátio de Santa Cruz, no bairro de Boa Vista da capital pernambucana.

            A escultura mostra o Rei do Brega sentado numa mesa de bar, à espera de quem chegar. Sobre a mesa, há o microfone, uma rosa, a bandeja com copos, a cerveja e um pedaço de papel, como se ele estivesse escrevendo a letra da música “Garçom”. Pela qual o imortalizou!

            De fato, achei o maior barato a ideia, pois tem tudo a ver com esse grande artista que representou tanto para o mundo da música, com a sua alegria, sagacidade, humor e inteligência. Tudo vitaminado ao extremo.

            O cara era só sucesso. Vida resolvida, nada a discutir. Esbanjava simpatia, conversava com todo mundo. Ele foi um tipo extraordinário de livre-pensador.

            Gostava de se exibir, era debochado, mas sabia mostrar serviço. Gostava de debater ideias e jogar um pouco de conversa fora, entre goles de uísque e baforadas de cigarro. Ele costumava ainda desfiar um rosário de causos e fazia a plateia gargalhar.

            Como revelou o fã: “Ele é um rei para mim, e agora poderei matar a saudade dele aqui, numa mesa de bar” – referindo-se à estátua.

            Com olhar penetrante e sorridente, Rossi contou uma história engraçada (mais ou menos transcrita e romantizada aqui por este modesto cronista), vivenciada ao longo de seus 50 anos de carreira musical. Certa feita, segundo este artista, estava fazendo um show num comício de Jaboatão de Guararapes (PE) para mais de 40 mil pessoas, e quando terminou o referido show, ele pegou uma Kombi para ir embora, só que os fãs o seguiram correndo, sem se deterem, no movimento total de delírio. Foi aquele frenesi!

            E não somente eu, mas você que está me lendo agora, tem ideia o vexame que deve ter ocorrido.

Envaidecido e orgulhoso, Rossi pediu ao motorista que fosse mais devagar para ter oportunidade de cumprimentar a sua legião de fãs bregueiros que ora o perseguia, freneticamente.

            Quando a Kombi percorreu uma certa distância do local, o carro já estava com uma velocidade em torno de 20 km por hora. Aí, Rossi, notou um sujeito correndo em sua direção, esbaforido feito um louco, cabelos desgrenhados e o suor escorrendo no rosto, querendo lhe falar alguma coisa - pelo jeito era o que demonstrava.

            Então, ato contínuo, sensibilizado, determinou que o motorista parasse o carro para atender ao apelo desse fã, merecedor sim pelo seu esforço descomunal.

            Rossi baixou o vidro do carro, e o fã já cansado, porém feliz da vida com aquela oportunidade de falar com o seu ídolo, assim se manifestou: “Rossi, eu também sou veado!”.

            Ele, com a sua risadagem e gozação de sempre, arrematou: “Isso faz parte do show!”.

 

 

                                                     LINCOLN CARTAXO DE LIRA

           

A nova realidade do aposentado

 

              

       Quando eu era criança lá em Cajazeiras, considerava-se velho um homem de 60 anos. Velho só, não. Velhíssimo. Hoje, surgiu uma geração de “novos velhos”. Não estou falando da baboseira de “melhor idade” e do lixo ideológico do politicamente correto, que tenta maquiar a realidade com palavras delicadas.

            Tenho 68 anos. Ainda não sinto o peso do envelhecimento, pode ser que mais para a frente aconteça. Acho que gozo de uma inteligência mediana, dói não entender porque ainda existe preconceito com os aposentados aptos a continuar trabalhando. E que se encontram incomodados com essa triste situação.

            Como costumo dizer, se eles forem longevos, que sejam positivos, que nos tragam benefícios. Simples assim.

            Para muitos, a aposentaria ainda é sinônimo de um momento idílico em que idosos invariavelmente ficam boa parte de seus dias sem trabalhar. No entanto, estudos demográficos comprovam que as pessoas que nasceram na década de 1960 estão ganhando pelo menos mais vinte anos de expectativa de vida.

Além disso, as pessoas que têm 40 ou 50 anos hoje em dia estão longe de estar no caminho para se tornar os “vovôs” e “vovós” de antigamente. Diante desses fatos, a visão que temos da terceira idade e da aposentaria precisa mudar.

Antigamente, a maior parte da humanidade se estuporava fisicamente no trabalho pesado nas fazendas, fábricas e minas. Agora a maior parte do trabalho pesado vai sendo executado por máquinas, com maior produtividade e sacrifício físico infinitamente menor para os seres humanos.

Observe que não são apenas celebridades e estrelas que se afastaram do estereótipo do envelhecimento. Toda uma geração que hoje tem entre 60 e 80 anos está escolhendo e construindo uma outra perspectiva de estilo de vida. É fato louvável, a ser celebrado.

O importante nesse segundo tempo da vida, que as pessoas estão descobrindo que pode ser o tempo depois dos 60, é procurar se dedicar mais àquilo que dá efetivamente prazer, conciliar isso com oportunidade de ter uma renda extra, de continuar tendo convívio social com colegas que também estão na ativa e de continuar atualizado como ser humano contemporâneo de um tempo em que as mudanças e as inovações são a regra.

Claro, óbvio ululante, que no futuro o trabalho físico será reduzido ao mínimo e que o mais importante será ter experiência, criatividade, ousadia e capacidade de reinventar a si mesmo.

Essa é a sacada, é você (acima de 60 anos) com você mesmo, a autossuperação e entusiasmo. 

 

                                            LINCOLN CARTAXO DE LIRA

 

 

O salto do sapato

 

                

        Vai longe o tempo em que dançar com rosto colado é coisa que os jovens de hoje não conhecem como preliminares de um ato de sedução. Nesses bailes ou boates de antigamente, os jovens rastreavam o salão em busca da garota para dançar e quiçá iniciar um namoro.

            É verdade. As danças se prolongariam e, na hora exata, os rostos se colavam e a sedução começava com uma conversa de ouvido. Transformando-se numa idêntica enciclopédia romântica que valia até mentiras ingênuas.

            Outro dia, eu circulava pela praia do Poço (Cabedelo), quando dei por mim, lembrei da inauguração da boate Cadeia, na década de 1970, que funcionava bem próximo do famoso restaurante Badionaldo. Um diário do passado foi invadindo a minha cabeça.

            Bons tempos aqueles onde se estudava e trabalhava muito para no fim de semana curtirmos as festas com os amigos e, evidentemente, com as garotinhas. Época que o mundo não estava perdido, estava achado. Você era o cara, o melhor papo da praça. 

            A inauguração da citada boate foi muito badalada. Fiz questão de participar com roupa e sapatos novos. O detalhe aqui está nos sapatos, mais na frente deste texto direi por quê.

            Festa rolando... o galanteador aqui na espreita, na expectativa que “pintasse um clima”. Ou melhor: de chamar alguma garota para dançar.

            Depois do convite formalizado de “vamos dançar” e aceito com o “sim”, começamos a entrar no ritmo musical, já arrasando, pois os nossos olhos já tinham se cruzado antes disso. Sinal de empatia para dançar, no mínimo.

            É. Logo vi que alguma coisa me puxava em uma de minhas pernas, e com isso perdi o compasso da dança.

            Eu olhei para os lados para ver o que estava acontecendo, e murmurei:

            - Nossa, alguma coisa está errada? Dei mais uma olhada em volta, e nada.

            - Será que eu estou bêbado ou desaprendi a dançar? Céus. Que coisa.

            Sem perder a pose, continuei ali dançando, mesmo desequilibrado. Porém, fora de ritmo. Vexame total.

            Que cena ridícula. Para meu espanto, ainda percebi um segurança cutucando o outro com o cotovelo, apontando na minha direção. Com aquele sorriso de bundão.

            Quando de repente, não mais que de repente, dei conta que o salto de um dos meus sapatos tinha caído e desaparecido. Até pensei que estava desamarrado. No duro. Que sufoco!

            Sim, cai na real: perdi o salto! Como? Não sei!

            O desespero tomou conta. Haja eu olhar a procura do danado do salto. E nada!

            A garota já incomodada, me olhando meio de soslaio, indagou:

            - Hum, tem alguma coisa errada? Você está sentindo alguma coisa?

            O incidente fez com que, ali mesmo, terminasse a dança e o papo.

            Nessa noite não dormi. De manhã, ainda na cama, fui me certificar. Poderia ter sido um sonho. Nada. Era vero.

            Até hoje, não sei onde o infeliz salto do tal sapato se escondeu, escafedeu-se.

 

                                   LINCOLN CARTAXO DE LIRA

           

Canal 100

 

                        

               Eu era garoto, não tinha entrado na adolescência, mesmo assim, jamais consegui me libertar das imagens de então, associadas ao velho Cine Éden, cinema localizado na minha cidade natal (Cajazeiras). Com fachada meio sombria de um azul anil desbotado, para um moleque, a verdadeira caverna de sonhos, com todos os tesouros de magia, fascinação... 

            É, ressalte-se, um tempo em que o estudo era grande, o tempo era largo e o dinheiro curto, que só dava mesmo para pagar a meia entrada.  

            De repente uma cortina bordô pesada se abria para a sala de projeção, onde saia o feixe de luz levando o espectador a rir, chorar e se emocionar, e antes de desligar todas as luzes, o operador deixava uma iluminação mais fraca durante a apresentação do Canal 100, no qual fazia ver o lado lírico, dramático, delirante do futebol brasileiro, sob a direção fantástica de Carlos Niemeyer. 

            Faz sentido, era como um ritual, entrar em algumas das salas de cinema no Brasil entre o fim dos anos 1950 e meados dos 1980 significava ter de passar por um cinejornal antes de chegar ao programa principal, o filme em cartaz. Um deles, o Canal 100, cobria todos os tipos de assunto, de política a cultura, de medicina a economia – e esporte, com evidente preferência pelo futebol.

            Ah, não posso esquecer: introdução pelos acordes iniciais de “Na Cadência do Samba” - pã, pã, pã, pã, pã, pã -, canção composta por Luís Bandeira e imortalizada na versão instrumental de Waldir Calmon, as cenas de bola nos pés, bola nas redes encantavam corações e mentes. Ficando a sua locução a cargo do vozeirão inconfundível de Cid Moreira.

            Para alegria de todos, mormente para a memória dos cinéfilos, o acervo do Canal 100, que nos últimos anos correu risco de desparecer por inépcia e descaso, voltará a ser examinado, recuperado e classificado – esse tesouro inestimável.

            O projeto faz parte do movimento Viva Cinemateca, lançado recentemente. Contempla a retomada de um trabalho interrompido em 2013, quando uma crise institucional se instalou no maior arquivo audiovisual da América Latina.

            Sim, é trabalho minucioso, de ourives, que inclui rever os filmes, identificar o conteúdo, eliminar partes estragadas, fazer emendas e encaminhar para duplicação em suporte digital.

            O zelo com o Canal 100 é compreensível e louvável. Mudou a maneira de ver o futebol – e influenciou as coberturas esportivas em todo o mundo. Dirigidos por Niemeyer, cinegrafistas como Francisco Torturra e João Rocha, entre outros, criaram um olhar mais aproximado das partidas, usando recursos novidadeiros de seu tempo.

            Por isso engrosso o coro: recuperar a memória do cinema é um verdadeiro gol de placa.

                                        LINCOLN CARTAXO DE LIRA

O encanto de Machu Picchu

 

              

       Recentemente, assisti o documentário sobre Machu Picchu (Peru), produzido pela TV Record, retratando a história cultural e a beleza deste fascinante lugar. Remetendo-me a um turbilhão de emoções quando eu lá estive em 2015.

            É preciso viajar um bocado pelo mundo para se dar conta de que Aristóteles estava certo ao citar a fraseologia: “É natural no ser humano o desejo de conhecer”. Melhor ainda repetir, de vez enquanto, a prece de Maomé: “Senhor, mostra-me as coisas como são”.

             Pois bem. O povo inca não era uma raça, mas uma casta de gente inteligente. Essa foi a definição mais perfeita que extraí do nosso guia turístico, Ronaldo, na viagem que fiz à encantadora cidade de Machu Picchu, em 2015.

            Isso mesmo! O Império Inca era formado por pessoas com alto conhecimento na astronomia, na engenharia, na física, na arquitetura, na agricultura, na arte, na organização política e por aí vai.

            Antes de conhecer a cidade mágica de Machu Picchu - encontrada pelo professor e antropólogo norte-americano Hiran Bingham, em 1911 - fiz parada noutra cidade, também sedutora, chamada Cusco, a capital histórica do Peru ou mais conhecida como a capital do Império Inca. De acordo com alguns arqueólogos, ela começou a ser povoada a partir de 3.000 a.C. Lá está reunido o que tem de melhor da civilização inca: museus, igrejas, praças e a impressionante construção do Vale Sagrado.

            Depois viajei de trem para Águas Calientes. No dia seguinte, parti para Machu Picchu, objetivo maior do meu roteiro. O dia estava esplêndido, o céu azul e o sol brilhante, o termômetro marcava 31º. A ansiedade era tamanha que o coração pulava dentro do peito. A cada patamar uma visão maravilhosa deste local incrível.

            Mesmo me agachando e amarrando os cadarços dos meus tênis, eu não tirava os olhos dessa beleza arquitetônica. Desencadeou em mim àquele sentimento de missão cumprida. Um sonho alcançado, após ter planejado várias vezes, mas sempre adiado.

            Observando calmo e longamente aquele cenário de tirar o fôlego, literalmente o pensamento voava, enquanto eu imaginava o que deveria ter sido tudo aquilo. Quem planejou? Quantos homens foram necessários para construir? Como eram as pessoas que ali viveram? Seus hábitos e costumes?

            Com seus olhos brilhando e sua fisionomia compenetrada, o nosso guia falava que essa cidade mística teria sido um local para recolhimento do Inca (o soberano), dos seus conselheiros, dos sábios e dos sacerdotes, para discutirem os destinos do Império. Detalhe: eles tinham adoração consagrada ao sol, à água e à mãe terra.

            Aí está, resumindo muito, a história dessa lendária cidade que, em 2007, foi eleita com uma das “Sete Novas Maravilhas do Mundo” e é considerada “Patrimônio Mundial da Unesco”.

 

 

                                                           LINCOLN CARTAXO DE LIRA

                                                           

Abandono social

 

                       

                Faz sentido, sem dúvida, dizer que as ruas do Brasil estão doentes. Não adianta improvisar, adotar medidas paliativas, abarrotadas de incongruência. O avesso do que se dá por certo.

            Refiro-me à exposição de moradores sem teto, de pessoas que consomem drogas abertamente, a qualquer hora do dia e em qualquer lugar, de vulneráveis subjugados pelo crime organizado, de crianças exploradas por adultos, familiares ou não, usando-as como reféns para inspirar algum tipo de misericórdia que resultem em dinheiro.

            Descordo frontalmente do consenso errático de que as pessoas estão nas ruas unicamente por serem pobres. Há nas ruas um efetivo incontável de usuários de drogas e indivíduos com transtornos mentais.

            O Brasil está de joelhos diante dessa mazela. Basta sair às ruas para confirmar essa realidade vergonhosa. Tá lá: símbolo máximo do descaso. E a cidade de João Pessoa não foge à regra, infelizmente.

            Fico triste ao constatar tudo isso. Um ambiente inóspito aos olhos. Uma cegueira da razão.

            Como diria pausadamente o ator Jack Palance nos anos 80, com seriedade e suspense (sim, isso é possível): “Acredite... se quiser”. Bom. Recentemente, quando me dirigia à Caixa Econômica Federal (agência Tambaú – Ruy Carneiro), como faço quinzenalmente, constatei essa triste realidade (dos sem teto), na marquise desta instituição financeira. Para documentá-la tirei a presente foto.

            Podes crer, fiquei surpreso com a reação de um deles (completamente drogado):

- Você... você mesmo. Porque está tirando foto? Não pode, não!

            E foi muito rápido. Muito. Aquilo soou como uma ameaça.

- Calma aí, amigão. Estou fazendo isso para ajudá-los.

            Tal exposição vexatória e degradante já faz parte de nosso cotidiano. Questão é que os nossos governantes e a sociedade não oferecem soluções. Mais do que se indignar, é preciso mudar conceitos. Fugir desse altruísmo patológico – quando a ajuda se torna inútil, improdutivo e até mesmo destrutivo.

            Entenda-se: a somatória de erros associada à ausência de atendimento psiquiátrico adequado e de oferta de tratamento para que a pessoa deixe de consumir drogas resulta em uma tempestade perfeita.

            Não é possível termos cidades saudáveis com essas pessoas largadas à desordem social da lógica da rua. Ou seja: temos que criar o conceito de ruas e cidades saudáveis para oferecer soluções.

            Uma política de Estado se faz urgente. Esse pessoal precisa de urgente acompanhamento psiquiátrico. Não tem como alguém ter a mínima chance de reconstruir a vida a partir da rua.

            Ainda há tempo para mudar, e querem saber até pedir desculpas por essa tragédia urbana.

 

                                         LINCOLN CARTAXO DE LIRA

           

A revolta dos cubanos

 

                      

        É verdade. Cuba ainda resiste ao capitalismo, mesmo que essa resistência seja às custas dos coitados dos cubanos que vivem à beira da miséria ideologicamente justificada para riquinhos entediados com o mundo do capital.

            Seus cidadãos relatam perda do poder de consumo e buscam oportunidade econômica e liberdade de expressão. Ninguém sai ileso dessa bagunça.

            O acesso à internet na ilha, ainda que tardio, acelerou o desejo de mudança das pessoas. Mas o que era uma vontade tem se transformado na última saída para fugir da crise. A mentalidade que os cubanos tinham antes não é a mesma agora.

            Li que os cubanos foram a segunda principal nacionalidade a solicitar refúgio para o Brasil, atrás apenas dos venezuelanos. Primeiro por ser um destino mais barato que os EUA, onde restrição na fronteira dificultam o ingresso. Segundo porque é comum que cubanos tenham familiares ou amigos que ficaram no Brasil após desertarem do Programa Mais Médicos.

            Sem tirar nem pôr, tá ruça a situação em Cuba, onde o carregador de malas ganha mais que um médico. Como diz uma cubana, graduada em economia, professora universitária: “É uma situação que te asfixia. O governo implementou medidas que colocam o povo na miséria”.

            Quem sabe, né? Isso só é possível em um governo com alto nível de insanidade, burrice e incompetência.

            Pelo visto, nada mudou de quando eu lá estiva em 2015, visitando a cidade de Havana. Aliás, a situação piorou! Muita gente está pirando.

            Na prática e no grosso, o maior problema de Cuba é ainda a falta da oferta de empregos. “Que adianta um alto grau de instrução e não termos uma remuneração decorrente desse conhecimento”, assim me foi relatado por um contabilista cubano.

            Um absurdo sem tamanho. Uma pobreza generalizada. Avanço na saúde é uma lenda. Embora exista uma rede básica de saúde adequada, herança soviética. No mais, tudo sucateado, aparelhos velhos amarrados com arame.

            Tudo lá funciona na base do improviso – a famosa gambiarra. No ranking de Liberdade Econômica, de 178 países, Cuba está em 176, à frente apenas da Coreia do Norte e Venezuela.

Não é só constrangedor, é vergonhoso e humilhante. Após anos de silêncio, os cubanos saíram às ruas para protestar contra o regime comunista. Poucas vezes ocorreram reações desse porte desde que a ditadura foi implantada, em 1959.

            Há, sem dúvidas, boas razões para tal. Não fosse o tirânico punho de aço da ditadura cubana, praticamente toda a população daquela degradação já teria fugido para algum país onde pudesse ser livre.

            Como se sabe, não há democracia em Cuba. Quem conhece o país sabe e vê o empobrecimento e a insatisfação da população, que sofre com o autoritarismo governamental. Sou testemunha ocular dessa triste realidade.

            Como diz lá na minha terra natal, Cajazeiras, esse regime não vale nem meio pequi roído. Alguém precisa sacudir o cinismo desse regime. As ditaduras acham possível calar as pessoas desligando-as do mundo – mas não, as coisas mudaram.

            Escarafunchando os registros de minha viagem a Cuba, apurei que o seu Partido Comunista tem 700 mil filiados, numa população de 11 milhões. Os “revolucionários” não são atraídos por elevados ideais socialistas, mas por benesses materiais que se estendem de empregos no setor público à garantia de vagas nas universidades.

            Sublinhando tudo, não há futuro para um regime que caducou e vai cair podre.

            O povo de Cuba clama a Deus.

 

                                                       LINCOLN CARTAXO DE LIRA