No carro. Não conheço lugar melhor para escutar música. Com o ingrediente que você não tem ninguém para aporrinhá-lo. Naquele friozinho do ar condicionado. Nessa atmosfera, ao ligar o rádio na busca de uma boa programação musical, fui surpreendido com a voz do radialista inteligente e irreverente chamado Mução.
Ele é um verdadeiro paidegua pra fazer rir. De sotaque e vocabulário bem nordestino. Fã das fuleragens. A sua brincadeira perturba, o seu humor é zombeteiro, e ainda tem o mérito de correr o risco de um processo judicial por calúnia e difamação. Escafedendo-se sempre com base naquela tese que “Todo crime é pecado, mas nem todo pecado é crime”.
Certa feita, ouvi de Nizan Guanaes, um dos maiores publicitários brasileiros, uma frase que é original à beça: “Comunicação não é o que a gente diz, e sim o que os outros entendem”. O personagem Mução, indiscutivelmente, detém esse talento nato no comando de sua festa radiofônica – esfuziante e libidinosa.
Pode-se até não concordar com o seu modo de agir, no entanto, é difícil não reconhecer a sua empatia com o público ouvinte, que bola de rir com as suas traquinagens.
Triiiiim!!! Toca o telefone na residência de dona Jandira, e passo a ouvir Mução, com palavrório fanhoso, dando início (perdão, por acaso, o texto não ter sido fiel ao áudio) a seguinte pegadinha:
- Alô, aqui é um funcionário do governo federal.
- Pois não!
- A senhora concorda com a superlotação das prisões?
- Claro que não.
- Muito bem. Gostaria de lhe dizer que a senhora foi sorteada pelo programa “Bolsa Cadeia”. Ou seja: estou aqui com uma relação de vários presos, que vai desde ladrão de carteira, passando por sequestradores, estelionatos, assaltantes de banco e principalmente àqueles condenados pelo famoso 171 do nosso Código Penal. Logo, diga-me quantos condenados eu devo enviar para a sua residência. Em troca, o Governo lhe pagará um salário igual à “Bolsa Família”, para cada preso recebido e alojado.
- Oxente! O senhor tá doido? Eu não tenho espaço aqui em casa, e mesmo se tivesse, eu não aceitaria.
- Se não tiver, não há problema. Acomode-os no seu quintal.
Pense num muído! Por um bom tempo, ficou a lengalenga dessa conversa telefônica: “Aceite, não aceito; aceite, não aceito”.
No fim, Mução, com a verborragia irrefreável e na maciota, sentenciou:
- Em razão da senhora não abraçar o tal programa social, eu vou ter que chamá-la pelo apelido de... “bisaco!”.
Assim, numa baita bronca, dona Jandira encerrou o diálogo. Mandou-o tomar naquele canto e desligou o telefone.
LINCOLN CARTAXO DE LIRA
Advogado, administrador e escritor