segunda-feira, 30 de abril de 2012

Triste viagem

       Antigamente tínhamos medo de avião – e deu até música. Hoje, o medo é de aeroporto. A bem da verdade criei fobia de aeroporto, da voz fúnebre de sua locutora oficial, dos atrasos, das trocas de portões de embarque. Sem falar daquela descarga supersônica do banheiro do avião, dos engravatados cheios de pigarros, do suco de laranja aguado. Chega!...
            Dias atrás viajava daqui para São Paulo. O vôo estava lotado. Filas de malas no check-in e de pessoas no portão de embarque. Já irritado, entrei no avião, esperei todos colocarem suas bagagens nos compartimentos de cima e fui para o meu acento. Se eu acreditasse nessas coisas meio esotéricas, diria de que, ao meu lado, sentaria alguém acima do peso ou que ronca ou que não para de falar a viagem toda.
            Se existe uma coisa boa da maturidade é dar importância apenas para o que é importante. Assim, deixei pra lá esse pensamento pessimista, quiçá sinistro. Como a minha poltrona era a de corredor, detinha toda a visão dos passageiros que adentravam na aeronave. A comissária já estava fazendo sua vistoria de praxe para a decolagem, e eu feliz imaginando que ninguém mais viria ocupar a poltrona vizinha (janela). De repente um senhor todo desajeitado vem se aproximando, se aproximando, bate no meu obro pedindo licença para se alojar justamente ao meu lado.
            Levantei a vista: -Pois não! Não há problema algum. Em seguida, amarrotado e olheiras que pareciam feito de rolha queimada, disse-me: “-Olá, tudo bem, sou um pouco gordo, porém não vou lhe incomodar”. Mas não há quem fique sem dar uma espiadela. Afinal, era um senhor bastante gordo incorporado numa estatura mediana.
            Daí por diante, começou o lamento e a atrapalhação da viagem. O passageiro detrás reclamava: “-Amigo (o gordo), pode inclinar um pouco a poltrona”. Suando em bicas, acabou com o estoque de lenços de papel. Toda hora esticava-se chamando a comissária de bordo para lhe servir água. Como não bastasse suas idas e vindas ao banheiro, sem me dar qualquer chance para cochilar. Afora ter que suportar o “strip tease” verborrágico de sua vida, repleto de tantos “floreiros”.  Fiquei Pensando: -Meu Deus, será que é ficção!
            Para encerrar, cheguei ao ponto de rezar e fazer promessa para ir à próxima procissão da Penha, da Guia ou do Círio de Nazaré no intuito de agradecer a tão almejada graça por ter chegado o fim dessa triste viagem, fulminada pelo “modus vivendi” embaraçado e inusitado.


                                                                 LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                  lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                                          Advogado e Administrador de Empresas
       

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Queda dos juros

       Com ambição desmesurada pelo lucro, os Bancos são o retrato acabado do brasileiro nascido para ser explorado pelas escorchantes taxas de juros. Perplexidade? Decepção? Irritação? Talvez um pouco de tudo isso.
            Acreditem: É pior que febre esses juros – é peste. Nossa taxa de juros tem sido, por décadas, a mais alta do planeta, e os custos efetivos do crédito para as empresas não têm paralelo no mundo.
            Num País volúvel e bizarro como o nosso, não é de se estranhar como eles, os banqueiros, agem com cinismo, hipocrisia e debocham de seus clientes. Agora, a perguntinha boba: por que os bancos não baixam a taxa de juros? E a resposta ainda mais boba: porque eles querem ganhar mais, e mais – só que, de forma abusiva.
            Preocupada com a desaceleração da economia, a presidenta Dilma, sem meias-palavras, fiel ao seu estilo, determinou que o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal reduzissem as suas taxas. No cheque especial e no financiamento de veículos, por exemplo, os juros deverão ser cobrados pelos bancos públicos a metade dos juros praticados atualmente no mercado. Ora, a intenção do governo é forçar os bancos privados a acompanhar a queda, de forma a aumentar a concessão dos empréstimos.
            Não tem como evitar a pecha que se abate sobre os bancos. E tampouco adianta dar conselhos nem tapinhas nas costas dos banqueiros. Ainda mais quando se verifica que, segundo pesquisa feita pela consultoria Economatica, no ano passado o setor bancário foi o de maior volume de lucro entre as empresas de capital aberto, excluídas da amostra a Petrobrás e a Vale. E abocanharam 39,4% do total de lucro obtido pelas 344 empresas avaliadas.
            E não existe a essa estória (e não história) de querer justificar os níveis de “spread” bancário no Brasil apenas pelo argumento de elevação da inadimplência, da existência de tributos ou de compulsórios, sem mencionar as margens líquidas nesses “spreads”, diante dos seus recorrentes recordes de lucros.
            Assim, digo – e não estou só – que não é preciso quebrar a cabeça para vislumbrar que a queda dos juros impulsiona a capacidade de aquecer a economia, por meio do consumo e do investimento.
            Aleluia! Ainda bem que existe uma lamparina no fim do túnel.


                                                        LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                        lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                        Advogado e Administrador de Empresas

segunda-feira, 16 de abril de 2012

O bom jornalismo

       Que beleza, fiquei feliz saber que a jornalista Lena Guimarães voltou ao Correio. Foi através dela que encaminhei os meus primeiros escritos para serem publicados neste espaço – Opinião. Sempre irrequieta na profissão, aura de “batalhadora”, com projetos ousados, diz que vai continuar atender aos leitores: “escrevendo sem ódio e sem medo”.
            Não precisa fazer uma dura ginástica intelectual, mesmo sem ser do ramo, para compreender que o jornalismo que se preze e adote uma linha progressista tem que ter esses fundamentos básicos. Some-se a isso o espírito pluralista dos seus comentários e a originalidade das coberturas.
            Reconheço que não é fácil. Mas quem abraça essa profissão não pode perder a percepção do que é certo, justo, honesto e honrado. Lembrei-me da definição do saudoso maestro Tom Jobim – definitivamente, o Brasil não é um país para principiantes. E complemento, na mesma esteira do jornalismo valente e vibrante, citando o inesquecível Millôr que costumava revelar: “Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados”.
            Ah, sim: eu sou do tempo, lá no interior - acho que já falei isso aqui -, que se dizia que jornal servia para embrulhar peixe. Depois, passei a valorizá-lo através de seu escrito, com tinta envenenada e em papel envenenado, na defesa da liberdade, da democracia e do bem comum.
            Não à toa, recentemente publiquei o artigo “Vídeo-bandido”, que poderia ter sido chamado também de “Áudio-bandido”, como sugeriu um leitor, mostrando o papel da imprensa em desbaratar o tal desfile de maracutaias. Apesar de que, no Brasil, todo mundo diz a favor da moralidade pública, mas poucos estão dispostos a pagar o preço de tê-la. Principalmente quando a situação é propícia, no caso os governantes, que substitui as esferográficas surradas pela caneta que nomeia e demite, que faz e desfaz, que nega ou libera bilhões de reais.
            É triste constatar aquele povo que não tem vez nem voz. Quando muito, fica na periferia do assunto. Urge, portanto, uma reforma na concessão e uso dos meios de comunicação de massa, para que, de fato, o povo possa ter acesso à informação não manipulada e a imprensa (não toda) deixe de ser apenas instrumento de lucro, de circo ou de pressão política.
            No mais, só chegaremos ao patamar civilizatório se efetivamente realizarmos uma sociedade mais justa, solidária e igualitária. E a imprensa/o jornalismo é partícipe desse compromisso.


                                                            LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                             lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                             Advogado e Administrador de Empresas

segunda-feira, 9 de abril de 2012

O poeta Nelson Cavaquinho

       Muitas vezes quando estamos numa roda de conversa, notadamente se as pessoas tiverem fazendo comentários sobre música, aí pinta um “aquele tempo” as canções tinham mais sentido poético, intenso, sensível, verdadeiro. Tipo de música que se ouvia devagar, com pena de acabar, que fazia bem aos ouvidos e... aos olhos.
            Foi, portanto, em um desses momentos descontraídos e especiais, como esse, que veio à tona o nome do mestre Nelson Cavaquinho – considerado por muitos, o maior poeta popular do Brasil. Produziu uma belíssima e intrigante obra musical. A morte, a melancolia e outros sentimentos profundos figuraram em mais de 600 de seus sambas. Impulsionados, no limbo, pela mistura de pessimismo e amor à vida.
            Há uma história dele que gosto de contar. Certa noite, Nelson Cavaquinho acordou assustado e suando frio. Havia sonhado que morreria exatamente às três horas daquela madrugada. Olhou para o relógio e os ponteiros marcavam 2:55 hs. Não dormiria mais. Passou a noite toda atrasando os ponteiros para que não chegasse o horário fatídico.
            Fiquei maravilhado quando escutei pela primeira vez o seu samba antológico “A Flor e o Espinho”: “Tire o seu sorriso do caminho/ Que eu quero passar com a minha dor”. Poeta de verve singular, que soube inspirar como poucos nos sabores populares, nos recursos simples, nas práticas tradicionais. Jamais foi tomado pela soberba de achar que era um craque em fazer a boa música. Pouco se lixava para o dinheiro. “Não tem porque me apresentar. Dinheiro não rima com nada”, assim vociferou ao recusar o convite para participar de um programa de tevê.
            Hoje, lastimavelmente, os ingredientes do sucesso são outros. Basta citar a letra desse “fenômeno” de crítica e público que assola as rádios e TV’s, não só no Brasil, mas também no mundo: “Ai, se eu te pego”, do artista chamado Michel Teló.Versos que expressam metaforicamente seu deleito sexual, chegando mesmo, pode-se dizer, a um estado de clímax sexual, um orgasmo. Haja tesão melódica! Pois é. São milhões de discos vendidos como se fossem água e picolé negociados pelos ambulantes em dia de domingo assoalhado (na praia). Ou melhor, como costumo dizer: é um baita mamão com açúcar.
            Acho não, tenho certeza, que o nosso querido Nelson Cavaquinho deve estar rindo lá de cima dessa presepada musical, quando, depois de seu banho frio e de um cálice de conhaque.


                                                    LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                     lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                     Advogado e Administrador de Empresas



segunda-feira, 2 de abril de 2012

Demóstenes, que decepção!

            Fiquei um pouco, digamos, “lento no pensamento”, para absorver esse rolo de denúncias cabeludas que se meteu o Senador Demóstenes Torres. Simplesmente - sob à luz do dogma moral - porque depositava nele a confiança de quem apresentava projetos para endurecer leis de combate ao crime e com a bandeira da defesa da ética na política.
            As denúncias bombardeadas em várias frentes são devastadoras e assustadoras. Numa leitura rápida, um Himalaia de provas e evidências vai soterrar esse parlamentar que defendia à moralidade e à cidadania. Àquela sua aparência de homem sério, probo e de comportamento retilíneo foi-se tudo para escanteio – como diria o cantor Morais Moreira.
            Que decepção! Não há meio-termo: desfile de maracutais ultrapassou a fronteira do tolerável. Suas palavras e atitudes, apoiadas num passado de credibilidade no mundo jurídico (promotor e procurador-geral) e como secretário da Segurança Pública de seu Estado (GO), eram respeitadas na cena política nacional. Não mais. Documentos e escutas telefônicas revelaram a sua ligação promíscua com um fora da lei chamado Carlinhos Cachoeira.
            Interessante é que ainda me espanto de me espantar com as notícias sobre os escândalos da política. Assim é demais: estupidez tem limite. O guardião da ética e dos costumes na famigerada “política séria” basta chegar ao poder para desmoralizar até os escândalos. Refletindo melhor, aí concordo com doutor Ulisses Guimarães: “Não é o poder que corrompe o homem; o homem é que corrompe o poder”.
            Aqui no Brasil a corrupção brota como petróleo brota com prospecção. Não é fenômeno novo. Quando era criança, sempre ouvia minha avó dizer: “Político, meu filho, não merece confiança!”. Inadmissível, permissa vênia, engavetar, desde 2009, na Procuradoria Geral da República, sob a apreciação do Dr.Roberto Gurgel, um relatório da PF referente à Operação Las Vegas, no qual é explicitada a ligação entre o senador e o tal Cachoeira.
            Hoje, é quase uma heresia questionar o papel importante da imprensa ao denunciar a quinquilharia suja da política, a qual procura acreditar e defender a política limpa, como sempre deve ser. Fugindo do estereótipo de servir mais ao escracho do que esclarecimento.
            Perdoe-me a obviedade confessional, mas o próximo escândalo, com certeza, virá. E a saída? Só vejo uma saída para a mudança: a voz das ruas.


                                                        LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                        lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                        Advogado e Administrador de Empresas