domingo, 31 de agosto de 2014

Pódium estético

       Um dos grandes lemas modernos diz para sermos nós mesmos. Igualzinho a nós, de cara limpa. Sendo um lema que nos conduz à autenticidade, à auto-estima e à liberdade. Uma coisa é certa: há desperdiço toda vez que confundimos o acessório com o essencial.
            Recorro a essa observação, quando li uma notícia que o Brasil deixou os Estados Unidos para trás na disputa pelo maior número de cirurgias plásticas do mundo. Conforme a Isaps (Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética), em 2013 foram realizados 1,49 milhão de procedimentos cirúrgicos estéticos por aqui, contra 1,45 milhão no país da América do Norte, o antigo campeão global.
            O Brasil, com esse título frívolo, vem confirmar que as nossas tupiniquins estão cada vez mais introduzindo silicone em tudo quanto é lugar para todos os gostos e apetites. Matéria- prima, inevitável, para gerar sentimento barato.  O bom exemplo jocoso desse estereótipo de loucura frenética é a Mulher melancia, Mulher melão, filé e outras tantas.
            Para os cientistas comportamentais, cirurgias plásticas – tal como maquiagem, sutiã e salto alto – equivalem o que os biólogos chamam de sinalização enganosa. Trata-se de imitar ou realçar características que tragam alguma vantagem pessoal.
            Na minha opinião, razoavelmente correta, é justo que as pessoas que se sentem desconfortáveis ao se olharem no espelho, submetam-se à cirurgia plástica quando possível. No entanto, é comum que ao fazer uma primeira cirurgia, a pessoa passe a notar outro defeito em si mesmo, transformando o bisturi numa obsessão e a única chave que lhe abrirá as portas para a felicidade. Eis a realidade a exigir sabedoria e superação. É hora de acordar.
            Como a situação anda braba por aqui, a classe dos cirurgiões plásticos logo reagiu, ou seja, agora o paciente pode pagar a intervenção em módicas prestações; o mercado, como seria de esperar, abriu-se para um grande contingente de “consumista plástico”.
            É fato. A medicina nos EUA continua ainda muita cara. Assim, muitos americanos viajam a outros países, incluindo o Brasil, para realizar suas cirurgias estéticas. O fenômeno já tem nome: “turismo médico em terra brasilis”.
            Não me canso em dizer que beleza é muito mais questão de personalidade do que padrões impostos pela sociedade. E quem tem consciência disso transforma defeitos em qualidades que marcam a presença do indivíduo de forma indelével. Pois a beleza reside dentro de nossas mentes, e depende de cultivá-la a nosso favor.
            Para fechar, eu cito a atriz Sophia Loren, “Nada faz uma mulher mais bonita do que a sua crença de que é bonita”.

                                                             LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                             lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                               Advogado e mestre em Administração
               
           
           

            

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Felicidade não se compra

       Recentemente fomos surpreendidos com o suicídio do ator e comediante americano Robin Willians. Logo ele que só transbordava alegria e muito talento profissional. Até que a morte veio e o leva, sem direito a um tchau.
            Há um filme maravilhoso que se chama “A felicidade não se compra”, no qual um indivíduo desesperado tenta suicidar-se e encontra outro (um anjo) que conversa com ele e tenta perceber a raiz de seu desespero. Quando o indivíduo declara que ninguém gosta dele, que nunca foi útil e que nada em sua vida deu certo, o anjo mostra-lhe como está enganado. Através de uma narrativa que recorre ao clássico flashback cinematográfico, o anjo rebobina todo o filme da vida daquele sujeito para lhe mostrar como sua existência fez toda a diferença.
            Esse filme poético e construtivo dá o que pensar na medida em que a vida daquele indivíduo parecia absolutamente banal. Tão banal que quase caímos no mesmo erro do personagem principal que acreditava ter vivido uma vida inútil.
            Já disse que, para mim, a felicidade é a soma de pequenos e grandes momentos que vivemos e jamais um dado adquirido. Podemos ser mais felizes durante breves minutos, meses ou anos do que outros que atravessam uma vida inteira tentando alcançar a dita felicidade. O que não impede, às vezes, de chutar o balde e arriscar novos vôos.
            Há também a questão dos valores que vão servir de balizadores para demonstrar constantemente se você está no caminho certo. Todo momento é um convite para que você decida quem é. E através desses valores que a cultura japonesa funciona da seguinte maneira: você precisa pensar na sociedade, depois na família e, por último, em você. Ou seja, se estiver com algum problema, não poderá demonstrar para a sociedade, pois todos irão se afastar de você e isolá-lo. Se falar com sua família, será tachado de fraco e desprezível. Nessa hora, sentindo-se sozinho, sem ninguém com quem compartilhar um problema, a pessoa pode ficar tão fragilizada e envergonhada que prefere abrir mão da própria vida a expor o que considera um fracasso.
            Por isso, no Japão, com base em tais princípios, a média nacional é de um suicídio a cada 20 minutos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, nas piores épocas, o tempo entre uma morte e outra cai para até 15 segundos.
            Acredito profundamente que só somos capazes de ser felizes se vivemos firmes no propósito de dar um sentido a tudo o que fazemos, dizemos e pensamos. Somente assim podemos estufar o peito e dar aquele arrebento grito: “xô, pessimismo!”.

                                                                   LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                                                lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                                             Advogado e mestre em Administração

                

domingo, 17 de agosto de 2014

Os falsos gringos

Dia destes, assim de repente, fechei os olhos, levantei a cabeça para cima como se estivesse rezando e passei a cantarolar “Agora eu sei/Sei, sei, sei, sei/Agora eu sei/Que você sempre me enganou”, versão da canção “I’ve been hurt”, o hit principal do álbum The Fevers, de 1969, chamado “Os reis do baile”.
            Lembro-me bem do lançamento desse disco (vinil) porque foi o ano em que eu aqui cheguei para residir/estudar nesta agradável e amada cidade, após ter deixado a minha inesquecível terra natal, Cajazeiras.  Apesar de toda a opressão do governo militar, era o tempo atemporal dos sonhos, esperanças e fantasias.
            Nessa década de 60, predominava o mercado de versão no Brasil. Os artistas preparavam versões antes que as músicas originais chegassem às lojas. Os produtores subornavam funcionários de outras gravadoras para ter acesso aos acetatos (discos “modelo”, que serviam de base para a prensagem de LPs) de futuros lançamentos. Os Carbonos – a exemplo também de Ronnie Von, Jorge Bem, Eduardo Araújo, The Fevers, Os Incríveis, Renato e Seus Blue Caps, Os Gonden Boys e outros – decoravam as músicas e corriam para gravá-las no estúdio. Todo mundo se esbaldava ouvindo aquelas canções.
            Já no meado da década de 70, surgiu o preconceito contra a música cantada em português. Posso dizer que era incrivelmente desimportante. O inglês imperfeito não era barreira. “Estudei inglês quando garoto, mas falar mesmo eu não falava. Eu mal sabia o que estava cantando”, confessa Dudu França. O grupo Pholas escrevia letras juntando frases tiradas de um velho livro de conversações em inglês. Fábio Jr. revelou que evitava conversar com as fãs, para que não percebessem que Mark Davis não era americano: “Eu dava autógrafos, mas não podia falar nada com elas. Era tudo rápido, e de óculos escuros”.
            Outro caso interessante é do cantor Chrystian, da dupla Chrystian e Ralf, que foi gravar um disco nos Estados Unidos, e quando terminou o trabalho, um técnico do estúdio lhe perguntou alguma coisa, ele, por sua vez, como não falava uma palavra de inglês, permaneceu mudo. O sujeito ficou impressionado: “Como assim? A pronúncia dele é perfeita!”.
            Essa espécie de “fast food” de filosofia americanizada, seguida pelos falsos estrangeiros, embora execrado pela crítica da época, foi importante para o desenvolvimento da indústria de discos do País. Havia outro fator que incentivava as gravadoras a lançar música em inglês: canções estrangeiras não passavam pelo departamento de censura e, portanto, não corriam risco de ser proibidas.
            Bom. Posso ter dado uma tênue ideia de que foi esse movimento que marcou a música brasileira e a minha geração.

                                                              LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                              lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                 Advogado e mestre em Administração
             
           

            

domingo, 10 de agosto de 2014

Judicialização do processo eleitoral

                Outro dia de manhã cedinho, ouvindo um determinado programa de rádio, pude constatar a tremenda preocupação do seu apresentador em não violar a legislação eleitoral. Passando, assim, o tempo todo alertando os seus ouvintes. E durante toda a programação não fez outra coisa que não fosse mandar “abraços e beijos” aos seus interlocutores, em face dessa amordaça normativa.
                Sempre tive a concepção legítima de que a eleição é uma grande festa da democracia, onde os agentes políticos se apresentam, mostrando suas experiências e suas propostas em prol do seu povo, através das redes sociais, entrevistas, encontros, comícios etc e tal. Hoje, praticamente, quase tudo está proibido. Esse desconhecimento e a decepção com os políticos têm levado os eleitores, cada vez mais, a perderem o interesse pelas eleições. Aumentando o descrédito do processo eleitoral e das necessárias mudanças que o País precisa.
                Não é demais lembrar que a soberania é popular, pois o poder tem como característica o fato de pertencer ao povo em sua universalidade. Portanto, a partir de casos concretos é possível verificar que o exagero de recursos e de interpretações de normas eleitorais leva o processo eleitoral a uma perigosa “judicialização das eleições”, em que a força decisória é transferida do povo ao juiz togado, donde a escolha que é a partir do voto passa a ser passível de anulação e a última escolha passa a ser exclusiva ao Poder Judiciário.
                Pego carona numa boa interpretação do articulista Marcos César Minuci, sobre o assunto, quando diz que não há instrumentos preventivos suficientes para evitar a corrupção eleitoral, de modo que os instrumentos jurídicos postos à disposição terminam sendo punitivos e utilizados depois que o fato já foi consumado, punindo não só o eleito, mas grande parcela do próprio eleitorado.
A não ser que minha bola de cristal esteja com defeito, nada vai mudar. Apesar de toda a rigorosidade punitiva da legislação eleitoral, a corrupção, o completo uso e abuso da máquina pública vão continuar. Com isso, nossa democracia está sendo posta em xeque.
                O que há de mais esquisito nisso tudo é o Congresso Nacional - que cabe realizar a Reforma Política - nada faz e tampouco dá qualquer explicação de sua absurda inação. Que nos leva parafrasear Chico Buarque, “o que não tem explicação nem nunca terá”.
                Para terminar, ouso ressaltar: os arranjos partidários para as eleições deste ano atingiram um novo paradigma de promiscuidade jamais visto no Brasil. Haja cinismo.


                                                                     LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                          lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                                       Advogado e mestre em Administração
               
                

terça-feira, 5 de agosto de 2014

O drama dos congestionamentos

       No último domingo, enquanto passeava com a minha cachorrinha Baby pela calçada da praia de Manaira, escutei um pedaço de conversa de dois senhores. O primeiro comentou: “Até quando vamos dar um basta nesse trânsito caótico na cidade?”. O segundo respondeu: “Isso só ocorrerá no dia em que os nossos gestores políticos tiverem coragem e competência para enfrentá-lo”.
            Como Baby quis continuar o passeio, tive de interromper minha bisbilhotice. Mas segui pensando sobre as razões que levam os referidos cidadãos a especularem sobre a problemática do trânsito que diariamente nos infernizam.
            Temerário fazer esse comentário nesse espaço tão curto. Porém, de forma breve, devo dizer que, nas últimas décadas, observa-se como o automóvel passou a dominar as ruas, com o pedestre e o transporte público sendo gradativamente desvalorizados.
            É estarrecedor constatar que algumas das nossas cidades não estão longe do colapso, resultado da inexistência de políticas integradas de transporte, uso e ocupação do solo. Os efeitos colaterais do modelo que adotamos, centrado no carro, são visíveis: degradação de meio ambiente, caos no trânsito, perda de produtividade, número crescente de mortes no trânsito e piora na qualidade de vida. Tem mais: a circulação urbana no Brasil é insegura e morosa demais, consequência de quase um século de altos recursos mal investidos.
            No plano doméstico, vejo com satisfação às medidas de engenharia que estão em curso para atenuarem os problemas de congestionamentos do trânsito em nossa João Pessoa. Não é fácil.  E a razão é simples: a frota de veículos no País não para de crescer, como um aumento assustador de 100% em dez anos (2002 a 2012), segundo documento produzido pelo Ministério do Meio Ambiente. Hoje, o índice de motorização é de 66,2 veículos por 100 habitantes. É insustentável e impossível, sob o ponto de vista físico, aumentar a infraestrutura viária para absorver proporcionalmente a esse crescimento.
            Contam-se nos dedos de uma mão as cidades de médio e de grande porte que não tenham problemas com o trânsito. A solução, para isso, passa pela política de rodízio, de estacionamento, fim de subsídios ao combustível e pedágio urbano. Essas medidas, por sua vez, devem estar atreladas com o investimento contínuo em transporte público de qualidade e da requalificação do espaço público para o pedestre e para o ciclista.
            Só quero dizer mais uma coisa: a mobilidade é a chave para cidades com mais qualidade de vida e menos desigualdades. O resto é teoria.

                                                                   LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                   lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                    Advogado e Administrador de Empresas