quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Dr.Enéas: gênio incompreendido

 

            Por mais que a gente não queira afirmar, mas, infelizmente, a desonestidade passou a ser endêmica entre os políticos brasileiros, sem distinção de credo, cor, raça, partido ou marca de cueca.

            Poucos políticos se tornaram tão emblemáticos de novos tempos como o Dr.Enéas Carneiro (1938-2007). Pois, para a imensa maioria dos brasileiros, a sua figura exótica do médico cardiologista – sempre de terno escuros, óculos de aros grossos e a vasta barba negra contrastando com a reluzente calvície – surgiu do nada no dia 15/09/1989, quando começou a campanha eleitoral para Presidente da República.

            A partir de então, sua história de vida começou a ser conhecida a conta-gotas e serviu à construção de um mito no imaginário popular. Nascido no Acre, Dr.Enéas teve infância bastante pobre. Encontrou redenção nos estudos (sempre foi o primeiro da turma, desde o ensino básico) e no Exército, onde se formou na Escola de Sargentos, no Rio de Janeiro, aos 21 anos.

            Com a ajuda de amigos médicos e conhecidos, ele fundou o Partido de Reedificação da Ordem Social – PRONA. Essa agremiação propunha salvar o País dos sufocamentos causados pela velha política.

Dr.Enéas tinha meros quinze segundos no horário eleitoral gratuito. Em sua primeira a aparição na tevê e no rádio, apresentou-se da seguinte forma: “Sou professor de cardiologista,... Nunca fui, não sou e nem serei político profissional. Meu Nome é Enééééas!”.

Um cara que jamais mercadejou suas ideias. E ninguém escapava da sua verve afiada e pontiaguda. O jeito esdrúxulo, o estilo rápido e assertivo de falar, associado ao slogan personalista logo chamaram atenção. Agora, quando recorro ao Google para encontrar algum estudo/comentário que me ajudasse a compreender como se deu essa transformação da imagem de Dr.Enéas, de personagem folclórica a “mito” de uma parcela mais conservadora da população brasileira.

Feito isso. Encontrei, com bastante frequência, declarações do tipo: “Ele foi o melhor presidente que o Brasil não teve”, “O mais sério e capacitado político brasileiro de todos os tempos”, “O incansável defensor da verdade”. Eu diria, então: um gênio incompreendido.

Resumiu certo admirador: “Dr.Enéas foi mais uma vítima do sistema político e da grande mídia que não deram espaço para que expusesse as suas ideias. Em 1989, se houvesse internet, redes sociais etc., com certeza ele seria eleito”.

            Pode notar aí: o lugar de Dr.Enéas já está escrito na nossa história. Seus ensinamentos continuam vivos – e inspiradíssimos.

 

 

                                            LINCOLN CARTAXO DE LIRA

                                                Advogado, Administrador e Escritor

           

           

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Nepotismo na política

 

             Estamos sendo conhecidos como o País da cueca, depois de mais um episódio envolvendo agora o senador Chico Rodrigues, pego com dinheiro escondido na cueca (entre as nádegas), provocando a indignação moral de todos.

            Com se não bastasse essa indignação, ele foi substituído automaticamente pelo seu filho Pedro Arthur Rodrigues, como primeiro suplente de senador, enquanto seu pai está preocupado em se defender junto ao Conselho de Ética do Senado. É ou não é um puro deboche?!

            Precisamos pôr o dedo nessa ferida: isso é absolutamente descabido e antidemocrático. O filho não seria eleito se o pai não tivesse sido. Voto não é herança. Isso é monarquia eleitoral.

            Não há escapatória, Brasil não se pode dar ao luxo dessa insensatez. É impossível evoluir numa Reforma Administrativa e Política sem banir a figura do nepotismo.

            Nepotismo é o termo utilizado para designar o favorecimento de parentes (ou amigos próximos) em detrimento de pessoas mais qualificadas especialmente no que diz respeito à nomeação ou elevação de cargos, ou indicações políticas com vista de preservar e continuar com interesses de ordem familiar, espécie de feudo político.

            Nestas eleições municipais - por aí, e por aqui -, vimos o patrimonialismo via nepotismo em pleno vapor. Esposas e filhos de candidatos ficha suja vão se autossubstituir. Pais, irmãos, filhos de senadores, deputados federais e estaduais em mandato lançando familiares a vereador. Início da carreira do profissional da política.  

            Já disse noutra oportunidade: a nossa prática tupiniquim tem o péssimo hábito de esbarrar nos ditames da realidade. É o caso da Constituição que faz apenas a ressalva da inelegibilidade reflexa, quando o cônjuge e os parentes dos governantes, para evitar o abuso de poder político, ficam temporariamente impedidos de se candidatarem. De resto, tudo é possível.

            O jeitinho está sempre presente no cotidiano brasileiro. Em matéria eleitoral, vamos encontrar também esse jeitinho na figura do nepotismo cruzado (“você cuida do meu, eu cuido do seu”), burlando assim o mecanismo de controle.

            É uma realidade: as redes sociais são um perigo quando se transforma em vício, quando viram plataforma de desinformação, valorizando o ódio, a luxúria, a discriminação. Contudo, se houver um uso sensato, como atalho para espalhar boas ideias e promoção de causas humanitárias, como também, denunciar a prática vergonhosa do nepotismo, que belo recurso temos em mãos.

            Portanto, sucinto, vou tentar dizer, a meu modo: a cultura do nepotismo se expande em silêncio. Ocupa vazios e sutilezas legais.

 

                                       LINCOLN CARTAXO DE LIRA

                                                  Advogado, Administrador e Escritor

               

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Gorda não é palavrão

            Outro dia, estava ouvindo uma conversa num restaurante, na mesa ao lado.

            - Não admito ser chamada de gordinha ou gorda. Tenho consciência dos meus quilinhos a mais. Mas, não aceito que ninguém me trate desse jeito.

            Não possuo aquela verve terapeuta que o caso requer, porém entendo que a “gordofobia” está impregnada em nossa cultura. Mostrando como o machismo e a mídia transformam o corpo feminino em objeto e impõe padrões estéticos artificiais.

            No livro “Gorda não é palavrão”, autoria de Fluvia Lacerda, que retrata a realidade das gordinhas, incentivando as mulheres a deixarem de lado as pressões externas para descobrirem efetivamente qual é o “corpo ideal”.

            Fluvia, em mais de 18 anos de carreira, como modelo plus size (tamanho maior) nos EUA, já foi fotografada em diversas situações e campanhas de moda, mas ainda tem que escutar muita pergunta chata e suportar a perplexidade alheia ao dizer que não pisa na balança e não tem o menor interesse em saber quanto pesa.

            No retorno de viagem ao Brasil pra visitar seus familiares, ela saiu para fazer compras, num dos shoppings em São Paulo. Enquanto estava ao celular, ficou mexendo nas peças dispostas na arara de certa loja. Assim que desligou, ela se dirigiu a uma das vendedoras:

            - Oi! Você tem outras estampas deste modelo aqui?

            A vendedora nem se deu ao trabalho de lhe cumprimentar e disse:

            - Não temos seu manequim nesta loja.

            Imediatamente, a Fluvia desbocada aparece. Respondendo na lata:

            - Acho que você não me ouviu bem. O que perguntei foi se tem outras estampas dessa aqui, não se tem meu tamanho.

            Antes que a vendedora se desse conta da besteira, Fluvia disparou:

            - Eu tenho dinheiro para gastar nesta loja. E não é pouco. Mas vocês perderam a oportunidade de vender porque são preconceituosas.

            Que coisa, hein? Exposição vexatória e deselegante. Não é preciso deitar em nenhum divã de psicanalista para entender a razão dessa cisma com as gordinhas. Não sei bem por quê? Só sei que o corpo perfeito é o corpo que você tem! Sem nenhuma comparação. Sem nenhum parâmetro. Sem nenhum certo ou errado.

            Sem meias palavras, não aceite piadas, não aceite olhares tortos, não aceite julgamentos, não aceite nada que lhe diminua. Se você quiser mudanças em seu corpo, você é livre pra isso, mas faça somente se realmente você deseja, e jamais, porque querem ou te obriguem a fazer essa mudança.

            As gordinhas, meu abraço e meu carinho.

 

 

                                        LINCOLN CARTAXO DE LIRA

                                           Advogado, Administrador e Escritor

                          

 


quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Cidade de Pompeia

 

            Minha listinha de destinos que quero conhecer aumenta a cada dia. Quanto mais eu pesquiso e leio sobre o mundo de viagens para mais destinos eu pretendo ir. Simples assim.

            E quando há uma referência de algum lugar que eu já estive, aí meu leitor (a) o contentamento é redobrado. Assim aconteceu quando a revista Veja publicou recentemente uma reportagem sobre a antiga cidade de Pompeia, situada a 22 km de Nápoles, na Itália, onde os cientistas encontraram um cérebro humano transformado em vidro pela erupção do vulcão Vesúvio, o que reforça a tese de destruição instantânea. Não é só: o órgão verificado preservou boa parte dos neurônios da vítima.

            Quando visitei esse lugar, tive a sensação de estar visitando uma cidade que ainda é habitada, já que se conservam a maioria dos edifícios e grande parte da decoração das antigas casas. Particularidade, chamativa e macabra da visita, foi a exposição de figuras (pessoas) que ficaram presas nas cinzas, em cujos rostos ainda podemos ver o pânico que viveram. São feridas profundas de uma triste história.

            Pompeia foi uma cidade do Império Romano, que foi destruída durante uma erupção do Vesúvio no ano 79, provocando uma intensa chuva de cinzas que sepultou completamente a cidade. Ela se manteve oculta por mais de 1600 anos, até ser reencontrada por acaso em 1748.

            Nas áreas arqueológicas de Pompeia, pude conferir que as cinzas e lama protegerem as construções e objetos dos efeitos do tempo, moldando também o corpo das vítimas, o que fez com que fossem encontrados do modo exato como foram atingidos pela erupção.

            Há indícios de que os seus habitantes podem ter sido os primeiros recicladores da história. Os arqueólogos descobriram que grande parte dos muros que protegiam a cidade era feita de pedaços de cerâmica quebrada, telhas descartadas, ossos, madeiras e outros objetos reutilizados.

            Olha, mais uma coisa. Impressionante é o zelo na preservação desse patrimônio histórico e cultural da humanidade. Pois um país sem memória é uma país que nega sua história, que nega a identidade do seu povo.

            No Brasil, infelizmente, nesse quesito, estamos à deriva.        

 

               

                                    LINCOLN CARTAXO DE LIRA

                                              Advogado, Administrador e Escritor