domingo, 1 de setembro de 2013

Inédito viável



       Continuaremos sendo ingênuos?  Claro que não.  Calderón de la Barca dizia: “Cuidado com águas mansas”. Ou seja, estava tudo aparentemente em ordem e tranquilo por aqui, mas de repente desbotou a voz raivosa das ruas.
            Realmente vivemos no País da piada pronta, quando vejo a decisão triste e lamentável da Câmara dos Deputados em absolver o parlamentar Natan Donadon, mesmo cumprindo pena em seu novo gabinete (presídio). E agora, vamos mais rir de quê? Diante de tamanha ironia, peço ao bom Deus que não permita que essa juventude que inundou as ruas do Brasil seja tomada pelo cansaço, pela decepção e pela desesperança.
            Pois é. O recado das ruas não poderia ser mais perceptível e afrontoso. É bom lembrar que, no mês de junho, tivemos várias mobilizações de jovem, pedindo passar a limpo o País, se insurgindo contra a forma de fazer política, contra a falta de representatividade dos políticos e a desconexão entre as necessidades do povo e as agendas do poder político.
            O escritor uruguaio Eduardo Galeno usa uma expressão para a palavra “utopia” que eu acho ótimo. Ele diz: “A minha utopia é o meu horizonte”. E aí completo: sonho é diferente de delírio. Por isso, não poderemos ficar numa postura de acomodação, de entorpecimento, achando e dizendo o tempo todo: “Alguém tem de fazer alguma coisa”. Esta frase tem uma resposta direta: Sou eu, como cidadão e cidadã, que tenho de fazer. Pode crer, não é delírio, mas um sonho verdadeiramente plausível.
            Há um canto clássico do repertório brasileiro chamado “Juízo Final”, de autoria de Nelson Cavaquinho e Elcio Soares: “O sol há de brilhar mais uma vez / A luz há de chegar aos corações / Do mal será queimada a semente / O amor será eterno novamente”. Piegas? Não.  Simplesmente fascinante! Perfeito! É o sentimento de esperança de ir atrás, de se juntar e de não desistir.
            É curioso notar que essa esperança torna-se mais emblemática na relação Estado-sociedade: ambos têm obrigações e ambos têm direitos. Vamos acabar com essa conversa conceitual comum de que a educação, saúde, transporte e habitação são direitos do cidadão, dever do Estado. Ora, cuidar para que o Estado cuide é um dever nosso. A tarefa do Estado é cuidar. A nossa tarefa é cuidar para que o Estado cuide.
            É preciso esperançar de verdade, indo atrás do que Paulo Freire chamou de “inédito viável”, isto é, aquilo que ainda não é, mas pode ser!


                                                                     LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                      lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                                               Advogado e Administrador de Empresa
           

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