Outro dia, enquanto cumpria minha
rotina de distanciamento social, dei de cara com o meu velho amigo Cordeiro,
num balcão de farmácia desta cidade. Como sempre, questionando alguma coisa. Do
tipo: você está conseguindo dormir? Tem pesadelos? Indo ao banheiro
constantemente sem ter diarreia? Está sentindo tédio?
Dessa vez, reclamando exaustivamente
o baque provocado pelo Covid-19: “Não aceito mais essa vidinha escravocrata.
Pior: fiquei muito angustiado por duas semanas quando senti alguns traços
apontados como de característica dessa temida pandemia. Fiz o teste, e o
resultado foi negativo. Apesar de confuso, cheguei à conclusão que tais
sintomas eram decorrentes da cizânia de minha mulher. Pura maldade, claro!”.
Aí vem toda sua história. No início
de março, deste ano, depois de se aposentar, ele foi até o INSS para registrar
a sua aposentaria. A mulher atrás do balcão lhe pediu algum documento de
identidade para verificar a sua idade. Olhou nos bolsos e percebeu que tinha
deixado sua carteira em casa.
Pediu desculpas à mulher e disse que
teria que voltar em casa e vir novamente mais tarde. A referida mulher, com uma
fleuma gentil, disse: “Desabotoe sua camisa”. Mesmo achando engraçado, fez o
que ela lhe pediu e abriu a camisa, exibindo o seu peitoral com cabelos
grisalhos encaracolados. Ela falou: “Pra mim, basta. Aqui já é prova suficiente
para a sua aposentadoria”.
Chegando em casa, contou para sua
esposa com entusiasmo sobre a experiência. E ela, sem tirar nem por de uma
pessoa revoltada, fulminou: “Você deveria ter baixado as calças, teria recebido
uma pensão por invalidez, também”.
Após ter ouvido o clamor do amigo
Cordeiro, desejei-lhe paz e bênção na solução do seu indigesto “lockdown
doméstico”.
LINCOLN CARTAXO DE LIRA
Advogado e
mestre em Administração
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