Vivemos
um tempo em que o cotidiano de milhares de pessoas que circulam pela cidade
grande é pontuado por incertezas, dúvidas, decepções, paixões, dramas e
esperanças. Porquanto, às vezes, aparece um sujeito com cara de intelectual
fazendo um trip-tease verborrágico de suas proezas para resolver todos os
problemas do mundo, notadamente para aqueles com visão pessimista da vida.
Mas tem, sim, profissional sério,
como aquele que apareceu no município de Sucupira, inspiração da obra do
dramaturgo Dias Gomes – “O Bem Amado”. Seu nome, Dr.Sinval Moreira,
psicanalista, que chegou para atuar na cidade através de uma carta de
apresentação assinada pelo Governador da Bahia. Diz Odorico, obtusamente:
- É um prazer receber o execelente
analista das Excelências. Por acaso, o governador está com algum
descacholamento neurotizante, quem sabe o fato dele ter renunciado à
candidatura, mas tem tanto renuncista andando por aí, até falando na
televisão...
- Não sou analista do Governador. –
Descontraído, respondeu Dr.Sinval, com a gravata meio torta no colarinho
aberto, a barba negra e rala no rosto encovado. Acrescentou ainda:
- Essa carta de recomendação foi um
amigo que me conseguiu. Estou realizando um trabalho de campo sobre o perfil
psicológico do brasileiro, que pretendo terminar aqui em Sucupira.
Odorico, por sua vez, lança uma
nuvem de fumo cubano para o teto, como pequenos discos voadores, e se esmera em
seu linguajar:
- Emboramente uma recomendação de
Sua Excelência abra portas, portões e portinholas, eu não sei que adjutório vou
poder dar ao amigo. Não me parece que o senhor terá aqui uma boa clientela. Não
que não haja birutistas compulsórios por toda a cidade. Noves-fora os
neuro-comunistas juramentados. Mas não creio que nenhum deles vá se deitar no
seu divã.
Sem perder a pose e sem rodeios,
avisa:
- Não obstantemente sejamos uma
cidade em desenvolvimento, Dr.Freud ainda não passou por aqui. De sorte que,
meu caro Dr.Sinval, temo que não fature nem pra pagar o seu instrumento de
trabalho, o divã.
No final desse coloquial, Odorico
estende a mão ao analista com essa pérola retórica:
- Claro, não vou deitar no seu
divã... mas meu sofá está às ordens. Não sou um divanista praticante, mas posso
ser sofadista eventual.
LINCOLN CARTAXO DE LIRA
Advogado e
Administrador de Empresas
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