segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Um analista em Sucupira



       Vivemos um tempo em que o cotidiano de milhares de pessoas que circulam pela cidade grande é pontuado por incertezas, dúvidas, decepções, paixões, dramas e esperanças. Porquanto, às vezes, aparece um sujeito com cara de intelectual fazendo um trip-tease verborrágico de suas proezas para resolver todos os problemas do mundo, notadamente para aqueles com visão pessimista da vida.
            Mas tem, sim, profissional sério, como aquele que apareceu no município de Sucupira, inspiração da obra do dramaturgo Dias Gomes – “O Bem Amado”. Seu nome, Dr.Sinval Moreira, psicanalista, que chegou para atuar na cidade através de uma carta de apresentação assinada pelo Governador da Bahia. Diz Odorico, obtusamente:
             - É um prazer receber o execelente analista das Excelências. Por acaso, o governador está com algum descacholamento neurotizante, quem sabe o fato dele ter renunciado à candidatura, mas tem tanto renuncista andando por aí, até falando na televisão...
            - Não sou analista do Governador. – Descontraído, respondeu Dr.Sinval, com a gravata meio torta no colarinho aberto, a barba negra e rala no rosto encovado. Acrescentou ainda:
            - Essa carta de recomendação foi um amigo que me conseguiu. Estou realizando um trabalho de campo sobre o perfil psicológico do brasileiro, que pretendo terminar aqui em Sucupira.
            Odorico, por sua vez, lança uma nuvem de fumo cubano para o teto, como pequenos discos voadores, e se esmera em seu linguajar:
            - Emboramente uma recomendação de Sua Excelência abra portas, portões e portinholas, eu não sei que adjutório vou poder dar ao amigo. Não me parece que o senhor terá aqui uma boa clientela. Não que não haja birutistas compulsórios por toda a cidade. Noves-fora os neuro-comunistas juramentados. Mas não creio que nenhum deles vá se deitar no seu divã.
            Sem perder a pose e sem rodeios, avisa:
            - Não obstantemente sejamos uma cidade em desenvolvimento, Dr.Freud ainda não passou por aqui. De sorte que, meu caro Dr.Sinval, temo que não fature nem pra pagar o seu instrumento de trabalho, o divã.
            No final desse coloquial, Odorico estende a mão ao analista com essa pérola retórica:
            - Claro, não vou deitar no seu divã... mas meu sofá está às ordens. Não sou um divanista praticante, mas posso ser sofadista eventual.


                                                                LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                  Advogado e Administrador de Empresas
 

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