segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Tragédia de Santa Maria



       Lamentavelmente este filme eu já vi: quando ocorre uma tragédia - como da cidade de Santa Maria - fala-se logo em mudar a legislação, criar novas leis. Tudo besteira. O que falta é obedecer às normas e uma fiscalização séria, sem tolerância, sem o famoso jeitinho brasileiro.
            Não tenho nenhuma afinidade com futurologia e sofro de aversão a previsão, sobretudo quando anunciam que, daqui pra frente, a vigilância vai ser mais rigorosa. E aí, com o tempo, o ímpeto vigilante arrefece e as coisas voltam mais ou menos ao que era antes.
            Como sempre, sempre, sempre ocorre, de quem é a culpa pelo infausto? Culpa da banda que usou fogos artifícios no palco. Culpa dos donos da boate Kisse que construíram o espaço de lazer com material combustível e permitiram o uso de tais artefatos. Culpa das autoridades fiscalizadoras que se apequenaram em não cumpriu fielmente o seu mister.
            Estou sendo até muito reservado em avaliar a justa dimensão desse episódio. Sei que algum leitor vai tirar onda e dizer que estou sempre dando notícias velhas, que estou mais enferrujado do que minha última Remington. E o que é pior, ele está certo. Uma vez que a cultura da transgressão é uma prática ordinária e desonesta em nosso dia a dia.
            No atacado, deplora-se a constatação da prevalência do lucro a qualquer custo sobre o direito de viver. É um tipo cinismo autorizado, um maquiavelismo abominável, em função de objetivos considerados maiores, com a idéia de que os fins justificam os meios. No caso da tragédia de Santa Maria os “seguranças”, supostamente orientados pelos donos, não teriam permitidos que ninguém saísse sem apresentar a quitação de suas comandas.
            A história do marechal Charles de Gaulle tornou-se clássica. Num dado momento, lançou a dúvida: “O Brasil é um país sério?”. Muito de nós ficamos chocados. Mas, volta e meia, essa frase torpe nos abate, quando se olha para trás com olhos decepcionados de quem, no final das contas, vê-se obrigado a dizer que nada acontece, e que nós não levamos as coisas tão à sério.
            Diante dessa vergonha, me vi tentado ainda a desabafar. Assim: essa tragédia é fruto da nossa profunda corrupção pessoal e política, da gaiatice a qualquer tema ligado à segurança, da nossa incapacidade de levar qualquer coisa a sério que não envolva lucro imediato.
            De modo breve, pouco se pode acrescentar ao essencial da dor humana, além de palavras de compaixão e consolo a que somente o tempo será capaz de conferir aos familiares das vítimas dessa história escabrosa.


                                                                          LINCOLN CARTAXO DE LIRA
                                                                         lincoln.consultoria@hotmail.com
                                                                      Advogado e Administrador de Empresas

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